segunda-feira, 26 de março de 2012

A Besta e o Sábio

Nas profundezas da terra se degladiavam a Besta e o Sábio.
O Sábio era altivo, belo e inteligente. Vestia uma túnica azul que realçava a longa barba branca. Seus olhos eram tranquilos, seu olhar compassivo, seus movimentos leves e ordenados.
A Besta era feia, desprezante e astuta. Seu corpo colossal, sua voz gutural, seu andar desordenado realçava o caos que tomava aquela criatura. Suas palavras provocavam o Sábio:


- Por que perde tempo parecendo ser o que não é, velho tolo? Toda esta altivez mesquinha, essa falsa superioridade, só engana a você próprio, pois por dentro você é igual a mim. - disse a a Besta com sua voz que ecoava de forma sinistra.

O sábio olhava para a Besta, sentia pena da condição dela, mas ao mesmo tempo reprovava a existência daquela criatura.
- Pois saiba que vossas palavras não atingem a minha pessoa. Criatura vil, conheço seus passos, entendo seus caminhos. Tu te entregaste aos instintos animalescos e tornaste o que és. - respondeu o Sábio com tranquilidade e firmeza nas palavras.

A Besta deu uma gargalhada descomunal e pôs-se a responder:
- Pobre idiota! Sim, me entreguei aos instintos, ao ódio, ao prazer, a tudo isso, e hoje desfruto da felicidade. Porque sou o que você nunca teve coragem de ser: você mesmo. Seu papo de "racional" não me engana. Você acredita que a razão é capaz de trazer felicidade? Se engana outra vez! Sabe por quê? PORQUE A RAZÃO NÃO EXISTE! Não passa de um fingimento, no fundo sua razão não é nada mais do que uma mentira que alimenta o seu instinto maior: o seu ego! - a Besta vociferou as últimas palavras e pôs-se a encarar diabólicamente o Sábio.

- Ego? Esta palavra não conheço. Pois que minhas obras todas são destinadas ao bem de todos, nada em meu nome. Mas tú, ó vil criatura que blasfemas diante da Verdade, não reconhece que revolta-te apenas contigo mesmo. Estás infeliz com sua condição.

- Infeliz? Não. Jamais. EU TENHO TUDO O QUE EU QUERO!


- Mas não sabes o que queres.

A besta riu.
- Quem é você para dizer sobre querer algo? Você sempre negou suas próprias aspirações em nome de algo que estava sempre mais além. Foi um asceta idiota que trocou tudo pelo quê? NADA! Estamos nós dois trancados neste buraco, condenados a ter que olhar um para a cara do outro e cuspir ofensas. Onde está toda sua superioridade agora?

- Pois minha superioridade não é deste mundo...

- De mundo nenhum. - interrompeu a Besta.

- Chegará o dia em que arrependerás do que blasfemas. Nesse dia eu estarei esperando por você, de braços abertos, para ser meu amigo.

- Sempre com esta melação. Pois esse dia nunca chegará! Sabe por quê? Porque esse buraco é tudo o que existe para nós. Mas aqui eu tenho tudo o que tenho: sexo, amores, companhias, festas. Tudo o que essa vida nos oferece. Quando chegar o fim de tudo, eu terei feito tudo que podia ter feito.

- Tu estragas a ti próprio. Enfiando-te nesta lama infernal que chama de prazeres, consomindo-te toda sua vitalidade, definhas sua própria existência. Olhe para ti. És uma Besta horrorosa. Um futuro de dor te espera. - o Sábio se compadecia de seu companheiro, mas não ousava se aproximar dele - Faça como eu faço. Uma boa colheita teremos se semearmos agora.

- PORCARIA! Quê futuro? Se diz tão compassivo, amoroso, mas não consegue aceitar alguém que age diferente de você. Você não quer que eu aceite suas ideias, você quer minha alma. Você quer que todos sejam como você! Sua tirania se esconde nesse dicurso de "all we need is love".

- Poque é o melhor para todos...

- O melhor é o caralho! Com que autoridade você pode dizer o que é o melhor para alguém? Cada um que saiba de si próprio.

O Sábio se entristeceu e retirou-se para a escuridão, onde pôs-se a meditar.
A Besta seguiu para o outro lado, tentou escalar o abismo para voltar a superfície. Mas como sempre, escorregava e caía de votla ao buraco.
"Se aquele velho não fosse tão mesquinho, podería me ajudar e sairiamos os dois daqui." Pensou a Besta.

"Se aquela criatura soubesse dar a mão a quem lhe quer ajudar, poderíamos ambos sair daqui." Pensou o Sábio.


(Por Igor Teo - http://artigodezenove.blogspot.com/2012/02/besta-e-o-sabio.html)

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